Prezados leitores,
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Sejam muito bem-vindos aos mujimbos do movimento, acompanhados pelo reco-reco, a dikanza, o assobio, o canto e a dança anunciando o carnaval de intervenção como o prato cultural do dia.
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Entre os meandros da cultura hip hop, vários são os nomes dos arquitetos líricos que ajudaram a definir a estrutura, os padrões da arte como se conhecem hoje em termos de liricismo. Entre os nomes indissocialvemente ligados as correntes de pensamento e expressão artística que surgiram ao longo dos tempos, podemos encontrar nomes como Chuck D, Big Daddy Kane, Slick Rick, LL Cool J, 2Pac, Notorious B.I.G, Snoop Doggy Dogg, Jay Z, Nas, Common Sense, Talib Kweli,Eminem, Ludacris, Kanye West, T.I, Lil Wayne, Drake e poderíamos continuar a citar, pois várias são as vozes, pensares e expressares que talham o tecido lírico e artístico desta arte. Entre os vários nomes dignos de realce, poderemos constatar um nome que sobrevive entre os tempos, um nome que bate as oscilações do game, um nome que se mantem digno, fiel e ereto ou que senão mesmo define o nome desta arte, este nome é indiscutivelmente KRS One.
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A edição actual tem como pontapé de saída um recorte da faixa de título “The Truth”, plasmada no álbum “Godsville”, uma obra lançada em Fevereiro de 2011 que traz como executores, o inigualável Dj Showbiz e o intemporal vulto lírico-artístico KRS One. Ora, a passagem em questão é a que se segue:
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ME, i´m on some other shit
Truth can´t stay on my mouth
I gotta spill it out (por KRS One)
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Numa era que se quer pluralista no pensar e livre no expressar o que se pretende é que os indivíduos independentemente das suas convicções políticas, religiosas ou sociais possam manifestar o que guardam no íntimo, sem medo de serem vitimizados por governos, pessoas influentes ou mesmo comuns na sociedade que não possuem aptidão para ouvir livremente opiniões contrárias sem reagir no ataque. O recorte supracitado surge claramente em defesa do princípio da “liberdade de expressão” consagrado na essência do sistema democrático que se concebe plural e inclusivo. Por conseguinte, falar é um direito que nos é permitido constitucionalmente.
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Embora sejam vários os países que defendem este direito a volta do globo teoricamente, na prática a maior parte dos países, sociedades e pessoas encontram extrema dificuldade em lidar com a frontalidade. Exemplos claros; manifestação da media e da sociedade Americana perante a afirmação “George Bush, doesn’t care about black people” por Kanye West, no Brasil, “hoje eu to feliz matei o Presidente” por Gabriel o Pensador, para citar alguns. Apesar do impacto das intervenções dos artistas, dependendo da evolução das sociedades em que estes estão circunscritos, fica dita a maneira com que a sociedade, público ou regime reagirão. Em Angola quando o acento de uma opinião recai sobre o regime a maneira de reacção parece ser apenas um radicalismo que se pinta de maneira flagrante ou de maneira subtil.
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Um caso de radicalismo flagrante no nosso contexto foi a morte trágica do jovem Cherokee que foi baleado enquanto talvez manifestava musicalmente a sua opinião ou talvez apreciava apenas o teor intervencionista de um tema do ilustre artista Mc K, uma voz de relevo incontestável que vem se firmando interventiva e verídica ao longo dos anos. Um exemplo de radicalismo subtil e sem mencionar nomes são todos aqueles casos de pessoas que manifestam o seu pensar contrário e são votadas ao abondono. Vejamos, na maneira subtil não se usam balas mas sim se asfixia socialmente aqueles que pensam contrário, fechando-lhes as portas da sociedade, retirando-lhes o emprego, posses, vetando o acesso as raízes de sustento na sociedade. Tudo isso feito com intuito de calar o pensamento contrário e instituir o medo. Ora, esta é a cultura intimidativa e repressiva em que se enquadra o prisma nacional e o mesmo pode ser constatado se fazendo uma rápida incursão arecortes extraídos da carta do respeitável Senhor Professor Doutor Marcolino Moco, de 29 de Novembro de 2009, onde o mesmo responde a seguinte persuasão intimidativa:
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"Se não for então que não se arrependa" ou "então será abandonado".
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Persuasão intimidativa a qual o digno Académico responde:
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“Espero nunca mais ser perturbado quando falar, nas minhas vestes de cidadão” por Marcolino Moco
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“Por enquanto, é este o meu manifesto contra o medo e contra uma ditadura do silêncio que não aceito” por Marcolino Moco
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“Eu recuso-me a tremer perante qualquer tipo de novos medos” por Marcolino Moço
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Ora, as citações do nobre Académico conduzem-me directamente ao tema “Nada a Temer” da obra discográfica “O Incorrigível” lançada em 2010.O tema em questão é interpretado pelo ilustre incorrigível Kid Mc que é acompanhado nessa investida pelo explosivo Fly Skuad. Os versos dos artistas são destemidos e precisos, vejamos:
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To disposto a enfrentar todos ESTES MONSTROS
Derrubarei, trarei algo novo ao povo
Este é o meu tempo então farei novas regras do jogo
Lanço punch lines prós rappers e também para o sistema
Aponto o dedo para quem a 20 anos nos governa
E pergunto porque NÃO NOS RESOLVE OS PROBLEMAS? Por Fly Skuad
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Alguém já sabia que eu haveria de lançar um dia
Só não sabia em que lugar seria
E acabei por lançar num país CARENTE EM DEMOCRACIA
ONDE CRITICAR É CHOQUE DIRECTO
ONDE FALAR A VERDADE RESULTA EM GRAMPO DO PEITO
NÃO TENHO MEDO, MANIPULEM A ARMA
Vocês podem me apagar MAS NÃO MATAM AS MINHAS PALAVRAS
Eternamente no activo, mesmo enfiado numa cova
As minhas rimas me manterão vivo
Trago a verdade para os que não conhecem
Muitos não me suportam mas sou a merda que vocês merecem
A minha luta começou na infância
A injustiça para mim sempre foi um motivo de intolerância
E vou lutando por esta gente carente
Que bala por um futuro minimamente decente e
Espera 4 anos pra votar novamente
Com ansiedade no voto, porque o político promete
Promete, a saga não para
Esta a voz de um cidadão Angolano que ACREDITA NA MUDANÇA
Não esconde a cara da paz e peito defronte a bala
Kid não cala, vomito rimas em grande escala
Temer é pra quem não sabe viver
E a coragem é a vantagem do homem pelo saber… por Kid Mc
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Ora, está claro que tanto no plano artístico como no plano político a liberdade de expressão se levanta para enfrentar o medo que nos é incutido e vem defender a honra pública na luta contra a cultura do medo que enquandro também a intervenção do destemido e incomparável artista Ikonoklasta, aka(também conhecido como) Brigadeiro Mata-frakuxz. O artista começa a sua trajectoria no movimento pelo lendário quarteto Anonimaz integrado por Crossdigga, NK, Kro Mo e White Shadow (nome do artista na altura). Ikonoklasta desde cedo manifestando um expressar artístico singular, progressista, inclusivo, defensor e interventivo. Expressar este que se expandiu com a sua formação tanto académica como pessoal e artística que conta também com o cunho de outro quarteto artístico fabuloso denominado Conjunto Ngonguenha, formado por (Grande L, Condutor, Keita Mayanda e Ikonoklasta). Em sinopse, este é o jovem que decidiu começar um programa de rap denominado “Era do Hip Hop” na prestigiosa Rádio LAC (Luanda Antena Comercial), numa época em que éramos apenas dezenas (diga-se de passagem), este é o mesmo jovem que elaborou a primeira critica ou análise musical do estilo a mixtape “Fogo Cruzado” , um registo discográfico congregando várias vozes do plano nacional, (crítica não aceite pela maioria dos feitores ou participantes da mesma), por não saberem lidar com a crítica também (diga-se em abono a verdade). Este foi o artista que ousou criticar em plano aberto o lendário e respeitável Espaço Bahia (Santuário do movimento), dizendo aos organizadores que os artistas deveriam ter no mínimo direito a água para beber durante as actuações. Este é o artista que foi convidado pelo ilustre mestre Valete a participar num tema em defesa a originalidade desta arte, acompanhados no tema pelo também relevante mestre mágico sonoro Sam The Kid. Este foi o homem que ousou caminhar de Lisboa a Luanda. Diga-se de passagem artista de obra imortal, homem de trajecto singular embora mero comum mortal.
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Entretanto foi no espectáculo de 27 de Fevereiro do célebre artista mestre Bob da Rage Sense uma das grandes vozes de caracter interventivo em que o artista Ikonoklasta manifestou aquilo que muitos cidadãos Angolanos pensam mas não ousam manifestar publicamente por causa da cultura do medo. É de lembrar que a intervenção foi feita numa casa de artistas onde quiçá a legislação deveria prever a livre manifestação de pensamento e emoção por parte dos artistas e se não o faz creio que quem esteja em falta é sim a constituição e não os artistas. Como já antes mencionei “o ataque ou crítica severa adiciono ou mesmo grotesta na arte hip hop é uma das tácticas usadas para provocar respostas imediatas”. Ora, para os Connaisseurs das técnicas características desta arte suponho que não tenha constituído surpresa uma vez que todos sabemos que a manifestação da persona artística no género rap ou cultura hip hop é feita por alguns artistas de maneira crua e nua tal como o sentir se manifesta, dai os cds de rap possuírem na capa o aviso “Parental Advisory Explicit Content Lyrics”. Por exemplo; um artista de outro género musical qualquer talvez diria:
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O senhor Dino Matross e o Sr. Virgílio Fontes Pereira são montros cavernosos a luz do sol.
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Na arte rap, expressão poética rural entenda-se que melhor não poderia ter sido dito, no rap quando se tem, mandamos mesmo pró caralho, especialmente quando entre os nossos, pois creio que em nossas casas devemos ter o a vontade de nos expressar. Adicionalmente, entenda-se que a manifestação em palco do interveniente em questão constitui uma técnica artística que tem como base a exploração do sentimento no seu estado mais bruto, sem ser peneirado e esta técnica mostrou-se tão efectiva que tão logo usada pelo mestre artístico em questão a mesma se fez ecoar por todos cantos da nação chegando até além-fronteiras. Está claro que aqui não foi apenas o poder da técnica que provocou o espanto mas sim a bravura ou loucura do artista em causa em mostrar o peito aberto contra um sistema repressivo e intimidativo. Curiosamente um dos senhores que o digno e destemido artista aborda na sua intervenção é também o mesmo senhor abordado na carta aberta do respeitável Senhor Professor Doutor Marcolino Moço, e o indivíduo em questão é o Secretário-geral do MPLA Senhor Dino Matross. Então perceba-se que é práctica recorrente o uso da intimidação e repressão por parte deste camarada bem como é de outros camaradas que representam o regime.
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Todavia muitas são as vozes que se levantaram contra a intervenção do artista, algumas por temerem represálias do sistema por serem vistas e tidas como contra o regime, outras por discordarem da maneira como esta foi feita, outras discordaram por apenas estarem habituadas a cultura do medo e já não mais força possuírem para se posicionar contra a mesma. Na minha óptica se existe um pedido de desculpa a ser feito este deve partir do artista para o colega de artes Bob da Rage Sense, uma vez que o último mencionado mais provavelmente desconhecia o formato da actuação que se mostrou de todo estudada e premeditada por parte de Ikonoklasta. Todavia o entendimento da intervenção em questão passa primeiro pelo entendimento da persona artística e mais especificamente o entendimento da força do braço interventivo da música rap e cultura hip hop.
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Entre as várias interpretações da actuação, uma das mencionadas é a do desrespeito do artista para com os adultos. Pergunto, que respeito é que estes adultos nos mostram intimidando-nos e reprimindo-nos? Temos criminosos do sofá e larápios de secretária a faltarem com o respeito a esta nação e o seu povo a décadas, esse é o género de respeito que respeitamos. Temos a aptidão cívica de não nos levantarmos como os Tunisinos ou Egípcios pois temos a maturidade de aceitar calados que nos faltem com o respeito. Creio que o que se passou foi exactamente como alguém disse “o feitiço virou-se contra o feiticeiro” pois é tanto o medo incutido na população que no primeiro levantamento aberto e frontal o regime amedrontado tremeu chegando ao ponto de sair a rua em passeata coadjuvada também por artistas para persuadir e apaziguar os espíritos.
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No meu leigo entender de cidadão não penso que manifestar o desejo de saída do poder a quem governa a 32 anos constitua crime ou insurreição mas pergunte-se aos entendidos em lei para que estes nos respondam fidedignamente. Creio que esta aqui patente uma clara inversão de papéis pois ao invés de se pintar as figuras mencionadas na actuação como vitimas, a lógica que assenta sobre o meu pensar diz sim que o artista é que esta ser vitimado por uma sociedade preconceituosa e amordaçado por um regime opressivo. Creio também que a importância atribuída tanto a actuação do artista como a manifestação pacífica (diga-se de passagem) ambicionada em praça pública, deveu-se a intenção por parte de alguns membros do regime de bajularem o chefe mostrando uma lealdade e zelo que nada ambicionam senão a ascensão destes nos círculos influentes do partido e obtenção de notoriedade perante o tão “bajulado chefe”, acabando assim por enviar mensagens dúbias a
um povo carente de orientação.
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Assim sendo a reacção se deve em parte ao exagero dos factos e maioritariamente se deve também ao medo deles (regime), especificamente por se saber como diz o caro artista Denexel “AS MASSAS NÃO ESTÃO DISTRAIDAS”, citação a que eu adicionaria que para além destas não estarem distraídas começam agora a ganhar mais “FORÇA PARA FALAR” e falar não pressupõe guerra mas sim o exercício de um direito constitucionalmente garantido, portanto creio que NADA TEMOS A TEMER pois certamente é também através do QUE TEMOS A DIZER que esta NAÇÃO GANHARÁ PERNAS PARA CORRER RUMO AO DESENVOLVIMENTO! Portanto como diria o mestre Shunnoz: FALEMOS IRMÃOS!
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Guerrilheiros fora da mata, soldados civis. Por Kadaff (Membro dos Kalibrados)
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Manda Bocas
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